O historiador húngaro John Lukacs (1924-2019), falecido em maio de 2019, pertence a uma considerável linhagem de historiadores conservadores (ou de não-esquerda). Por mais incrível que possa parecer aos neófitos ou afeitos ao ensino regular e universitário, que só fazem conhecer historiadores marxistas como Hobsbawm, Hill, Thompson, Anderson ou Harvey, há um considerável número de historiadores conservadores, o que até já levou o esquerdíssimo jornal inglês The Guardian a se perguntar “por que todos os bons historiadores são direitistas”? Niall Ferguson, David Starkey, Michael Burleigh (apenas entre os vivos e pujantes). E ainda valem menção: Paul Johnson, Hayward, Pryce-Jones, Nash, David Pietrusza, Vincent Cannato, Gertrude Himmelfarb, Paul Hollander, James Pierson, Robert Conquest, Hilaire Belloc, Christopher Dawson, Jacob Burckhardt e Oswald Spengler.
Lukacs, que não devemos confundir com seu compatriota e gênio do mal marxista György Lukács (1885-1971), foi um sobrevivente e refugiado do comunismo imposto à sua Hungria em 1946. Também teve de escapar dos nazistas, visto que sua mãe era judia, mas quando a União Soviética participou das forças de combate ao nazismo, estava vacinado contra a narrativa que muitos ocidentais enamorados do comunismo tentaram – e com relativo sucesso conseguiram – de que os comunistas libertaram a Europa do nazismo.
Notabilizou-se pelo seu A History of the Cold War (1961) e as editoras brasileiras preferiram publicar suas análises sobre o primeiro-ministro britânico Winston Churchill em O duelo: Churchill x Hitler (2002), Churchill. Visionário. Estadista. Historiador (2003) e alguns outros. Seu primeiro trabalho fora The Great Powers and Eastern Europe (1953).
Assim que imigrou para a América, para onde tantos outros em situação parecida imigraram durante e no pós-guerra, logo radicou-se na Chestnut Hill College, uma universidade católica. E sua preferência por uma universidade pequena, fora do radar do mainstream acadêmico (os intelectuais da época, segundo Lukacs, eram “anti-conservadores, anti-católicos e anti-anti-comunistas) não foi por falta de opção, mas uma escolha deliberada. Graças ao historiador Ross J. S. Hoffman, Lukacs entrou em contato com o grande pensador conservador e católico Erik von Kuehnelt-Leddihn, que já havia conseguido deixar a Áustria. Lukacs lecionou na Chestnut pelo resto de sua carreira.
A experiência de John Lukacs com o comunismo foi essencial para compreender qual deveria ser a abordagem da América diante do comunismo: a postura isolacionista e de confiança no poder da redemocratização global de Woodrow Wilson, imersa num ambiente onde diversos intelectuais viam o comunismo com simpatia, “‘apesar’ de Stalin ser um ditador” ou a postura de Henry Truman, que desde o princípio nunca encarou a União Soviética como um inimigo comum a se tratar de maneira puramente pacífica e apaziguadora. Lukacs, com seu vasto conhecimento histórico e experiência pessoal, preferia a abordagem de Truman.
Apesar disso, posteriormente, Lukacs se opôs à intervenção americana no Vietnã, pois acreditava ser a “guerra errada, na hora errada”, embora, evidentemente, tenha considerado “imbecil” o radicalismo de esquerda da década de 1960 na sua oposição à guerra do Vietnã.
John Lukacs declarou voto em Ronald Reagan em 1980 e escreveu artigos para periódicos conservadores como a National Review e a Triumph e foi convidado de William Buckley Jr. para o aniversário de 25 anos da National Review. Lukacs demarcou sua posição no meio conservador americano, embora não tenha permanecido ativo nos anos seguintes. Presidiu a Catholic Historical Association em 1977, demarcando também com muita clareza seu papel como historiador católico e americano, embora não visse – como Dawson – o futuro do catolicismo americano com tanta grandeza (Lukacs considerava o catolicismo americano demasiadamente “ansioso” para se alinhar naturalmente ao americanismo comum).
Que a obra de Lukacs possa ainda ser bastante lida e apreciada e que a alma do historiador descanse em paz.
Olá,
o que você achou deste conteúdo? Conte nos comentários.